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Communication Studies - Estudos em Comunicação
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Edgard Rebouças1, Mariana Martins2

Evolução da regulamentação da mídia eletrônica no Brasil

 

A comunicação eletrônica e de massa como hoje a conhecemos por meio do rádio, da televisão, dos telefones, da internet ou de qualquer convergência tecnológica está prestes a passar por mais uma mudança estrutural: da transmissão analógica para a transmissão digital. Essa mudança vai possibilitar inúmeras - e ainda não totalmente conhecidas - formas de interligação desses meios. Tal situação vai se deparar com o emaranhado legal referente ao setor e, mais, uma vez, há a eminente possibilidade de a conjuntura pautar a estrutura e o que ocorrer de fato definir o que será de direito.
Como está explícito que historicamente não há uma política clara para o setor de comunicações no país, o aceno do atual governo para mais uma versão do que viria a ser uma Lei Geral da Comunicação de Massa (BERNARDES, 2007) corre o risco de se tornar mais um factóide político que, pela inércia, acaba beneficiando apenas os interesses privados, em detrimento do interesse público.
Este artigo tem o objetivo de fazer um resgate de como se deu a evolução da regulamentação da mídia eletrônica no país, às vésperas de se completar 150 anos do primeiro serviço telegráfico em território brasileiro, inaugurado em 7 de Agosto de 1858, com a linha entre as cidades do Rio de Janeiro e Petrópolis. Tal resgate se faz necessário para que seja melhor compreendido como se deu o processo de aquisição e uso desses meios no Brasil e para uma melhor análise das mudanças que deram origem a eles ou até mesmo as mudanças às quais eles deram origem. Desta forma, pretende-se neste artigo resgatar um pouco do que foi a história e as políticas de comunicações no país, e oferecer uma base para reflexão e análise para que futuras iniciativas não cometam equívocos correntes ao longo desta história.

Ainda no século XIX

Como dito anteriormente, a primeira comunicação oficial por meio eletrônico ocorrida no Brasil foi em 7 de Agosto de 1858. Neste dia foi criado o primeiro serviço de telegrafo do país, que contava com uma linha entre o Rio de Janeiro - a época capital federal - e Petrópolis - cidade na qual o imperador D. Pedro II tinha a sua casa de campo. A linha, a princípio, servia quase que exclusivamente para o contato do imperador com a Corte.
Dois anos depois, em 1860, houve a primeira regulamentação do telegrafo com o Dec. Imperial n 2.624, de 21/07/60. O decreto tinha por finalidade estabelecer os objetivos, os tipos de serviços e as tarifas do novo meio de comunicação. Em 1864, outro decreto, de n 3.288, fez uma pequena alteração no anterior e incluiu a determinação de que o telégrafo devia atender às necessidades do governo, do comércio e dos cidadãos. No final de 1870, o Dec. Imperial n 4.653, de 28/12/70, fez com que os serviços de telégrafos voltassem para as mãos do Estado, e o governo começou a elaborar um plano nacional para o serviço.
Pouco mais de vinte anos depois da chegada do telégrafo foi registrada no Brasil, em 1879, a primeira regulamentação do serviço telefônico. Com o Dec. Imperial n 7.539, de 06/08/79, D. Pedro II autorizou a criação da Brazilian Telephone Company para instalar telefones no Rio de Janeiro. Esta regulamentação só entrou em atividade em 1880.
Em 1889 foi proclamada a Republica, e a primeira Constituição da República, de 1891, deu aos estados da federação o poder de criar seus próprios sistemas telefônicos e vender serviços. Porém, este decreto foi revogado em 1917 pelo Dec. n 3.296/17, que devolveu ao domínio exclusivo do Governo Federal o poder de vender os serviços de telégrafo e telefone.

O século das comunicações

O século XX foi marcado pela explosão das tecnologias de comunicação eletrônicas e de massa. No Brasil, a primeira transmissão oficial de rádio no foi feita pelo então presidente Eptácio Pessoa em 7 de Setembro de 1922, em um discurso comemorativo dos 100 anos da independência, apesar de já em 1894, o padre Landell de Moura ter sido o pioneiro mundial nas experiências de transmissão radiofônicas. Mesmo já existindo estações da rádio em várias cidades brasileiras, em 1924 foi aprovada uma nova regulamentação dos serviços de radiotelegrafia e de radiotelefonia, sendo que o serviço de rádio propriamente dito ficou de fora. Foi somente em 1931, com o Decreto n 20.047, de 27/05/31, que a radiocomunicação foi regulamentada no país. Este decreto tem importante significado para o histórico das políticas públicas de comunicações no Brasil, pois estabeleceu regulamentações tais como:
1. Os serviços "são da exclusiva competência da união";
2. Normatizou o processo de concessões;
3. Garantiu o direito autoral;
4. Criou a Comissão Técnica de Rádio, formada por três profissionais para o estudo das questões de caráter técnico, sugestão de medidas e coordenação das freqüências; e
5. Se adiantou no tempo ao dizer que "constituem serviços de radiocomunicação, a radiotelegrafia, a radiotelefonia, a radiofotografia, a radiotelevisão, e quaisquer outras utilizações de radioeletricidade, para a transmissão ou recepção, sem fio, de escritos, sinais, imagens ou sons de qualquer natureza" [grifo nosso].
No entanto, ainda mais importante, foi o Decreto 21.111 de 01/03/32, que regulamentou o decreto do ano anterior e ainda definiu importantes pontos que perduraram pelos 30 anos seguintes. O decreto de 1932 estabeleceu prazo de concessões de 10 anos; um mínimo de 2/3 de diretores brasileiros para empresas nacionais; que as emissoras deviam ter uma orientação educacional; que o tempo máximo de publicidade em um programa devia ser de 10%, sendo que cada inserção não podia passar de 30 segundos e deviam ser intercaladas; e criava ainda uma escola profissionalizante para técnicos e operadores de rádio.
O ano de 1937 foi marcado pelo início do Estado Novo, após o auto-golpe de Getúlio Vargas. O país entrou em um regime ditatorial e o rádio passou a ser um dos instrumentos de poder mais utilizados por Vargas, a exemplo do que já faziam seus inspiradores Adolf Hitler, na Alemanha; e Benito Mussolini, na Itália.
Em 1938 foi fundado o grupo Emissoras e Diários Associados, de Assis Chateaubriant, com cinco emissoras de rádio, doze jornais e a revista O Cruzeiro. Mais tarde, nos anos 50, Chateaubriant viria a ser o responsável pela entrada da televisão no Brasil.
Em 1939, ainda no governo de Vargas, foi criado do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), vinculado diretamente ao gabinete da Presidência da República, que tinha como função controlar os conteúdos dos rádios, impressos, cinema e teatro. Foi também neste ano que se iniciaram as retransmissões obrigatórias e em cadeia nacional da Hora do Brasil, programa produzido pelo DIP.
Em 1940 a ditadura Vargas se apropriou da Rádio Nacional do Rio de Janeiro e a transformou em veículo oficial do Estado Novo. Aquela ditadura acabou no ano de 1945 e com ela acabou também a censura prévia, com o Decreto n 8.356/45.
Final da década de 1940, começaram os preparativos para a chegada - que se fazia iminente - do veículo de comunicação de massa que além do som trazia a imagem, a televisão. Foi 1946 que ocorreram as primeiras experiências de transmissão da televisão feita pela Rádio Nacional, mas iniciativa não passou das experiências técnicas.
Um fato raro nas políticas de comunicações no país foi a criação da regulamentação da televisão antes mesmo de sua inauguração. Por meio da portaria n 692, de 26 de Julho de 1949, foram estabelecidas as normas para a utilização da freqüência VHF, o que definia o modelo de 12 canais para o serviço de televisão. O lançamento da TV Tupi de São Paulo só ocorreria em 18 de Setembro de 1950 por conta do empresário Assis Chateaubriand.
Getúlio Vargas voltou ao poder e publicou o Decreto n 29.783/51 estabelecendo o prazo de concessão dos canais de TV em três anos, e criando uma comissão para elaborar um Código Brasileiro de Radiodifusão e Telecomunicações - com o suicídio do presidente em 1954, o decreto foi revogado depois da pressão dos radiodifusores junto ao governo Café Filho. No ano de 1952, o Decreto n 31.835/52 incorporou à portaria criada em 1949, o sistema de UHF e definiu o padrão de imagem de 30 quadros por segundo, com 525 linhas, idêntico ao padrão adotado nos Estados Unidos.
A instalação de torres para transmissão entre Rio de Janeiro e São Paulo foi toda arcada pelas emissoras comerciais existentes. Em 1956, Assis Chateaubriand inaugurou mais nove estações em diferentes capitais brasileiras. Isto ocorreu sem nenhuma regulamentação que observasse a possibilidade de monopólio e/ou a propriedade cruzada dos meios, as regulamentações existentes já não davam conta de acompanhar o crescimento rápido do empresariado do setor.
Os anos 1960 foram marcados pelo aparecimento mais forte do Estado nas políticas de comunicações. Em 1961, importantes decisões, como o Decreto n 50.450/61, de 12 de Abril, obrigava a exibição de filmes nacionais na televisão à proporção de um nacional para cada dois estrangeiros (em 1962 este decreto foi reformulado para a obrigação apenas um filme nacional por semana sem importar a quantidade de filmes estrangeiros); o Decreto n 50.566/61, que estabelecia a criação do Conselho Nacional de Telecomunicações (Contel), para propor uma nova legislação para o setor; e o Decreto n 5.840/61, de 24 de Junho, que voltava a limitar o prazo de concessão de rádio e TV em três anos, não mais em dez. O último decreto desse ano, o n 51.134, de 3 de Agosto, restabeleceu a censura prévia e ditou uma série de normas como a proibição de cenas de crueldade, sensacionalismo e preconceito, além de proibir a exibição de cenas de atores com maiô ou peças íntimas, mesmo em comerciais. Este foi o último ato de Jânio Quadro para o setor, antes de renunciar à Presidência em 25 de Agosto alegando a pressão de "forças ocultas".
Em 27 de Agosto de 1962 a Lei n 4.117/62 instituiu o Código Brasileiro de Telecomunicações, que autorizou a criação de uma empresa pública, a Empresa Brasileira de Telecomunicações. A Embratel além de amenizar as sanções deu maiores garantias aos concessionários. Nesse código, que se tornou o documento máximo do setor até 1997, estava prevista a regulamentação nas concessões de rádio e televisão, mas as decisões de renovação e novas concessões eram exclusivas do poder executivo.
O Código Brasileiro de Telecomunicações passou por reformulações em 1963, com o Decreto n 52.026/63, que o regulamenta; em 1967, com os Decretos-lei n 200/67 e n 236/67; em 1972, com o Decreto n 70.568/72; em 1976, com o Decreto
n 78.921/76; e ao longo dos anos que seguiram com leis, decretos e portarias não diretamente relacionados ao setor, mas que viriam a interferir no Código. Entre as determinações de seus 129 artigos negociados no Congresso Nacional desde 1953, a maior parte preserva os princípios dos decretos de 1931 e 1932:
1. A manutenção do sistema misto público/privado, nos procedimentos de concessão, na interdição do capital estrangeiro;
2. O caráter educativo e cultural;
3. A definição dos limites para a propriedade de empresas do setor;
4. A criação do Conselho Nacional de Telecomunicações, com função de acompanhar a regulação/regulamentação das comunicações.
O decreto n 59.366, de 1966, instituiu o Fundo de Financiamento de Televisão Educativa, mas não saiu do papel efetivamente. Por outro lado o Departamento Federal de Segurança Pública aumentou a censura dos meios de comunicação.
Um ano importante para entender as políticas de comunicação no Brasil foi 1967. Durante esse ano muitos foram os acontecimentos promovidos pela ditadura militar. Foi criado o Ministério das Comunicações, que englobou a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, a Embratel e a Companhia Telefônica Brasileira. Apesar de criada em 1962, a Embratel começou a ser operada de fato em 1967. O Decreto-Lei n 236, de 1967 modificou o anterior Código Brasileiro de Telecomunicações, estabelecendo o total de no máximo dez estações para cada grupo/entidade. Sendo limitando em cinco a quantidade de emissoras em VHF. Manteve a decisão de que pessoas estrangeiras não poderiam participar da sociedade e/ou dirigir empresas de radiodifusão. O decreto também determinou que a origem e o montante dos recursos financeiros dos interessados em desfrutar de concessões deviam ser submetidos à aprovação do Contel. Deveriam também estar submetidos à aprovação prévia do órgão e do Ministério das Comunicações todos os atos modificativos da sociedade, assim como contratos com empresas estrangeiras. Esse Decreto-Lei ainda continua em vigor.
Começou em 1968 o período mais duro da ditadura. O Ato Institucional n 5 estabeleceu a censura em sua forma mais perversa. Nada que não fosse conveniente ao regime poderia ser exibido e o desrespeito estava enquadrado na Lei de Segurança Nacional. Naquele ano também foi criada a Assessoria Especial de Relações Públicas (Aerp), responsável pela propaganda política da ditadura militar.
Em 1972 o Programa Nacional de Telecomunicação regulamentou a formação de redes nacionais. A Rede Globo se tornou a maior rede nacional de emissoras de televisão, com mais de 36 filiadas e centenas de retransmissoras pelo país. Enquanto em 1972 as emissoras comerciais conseguiram se organizar em forma de Rede e estabeleceram o seu poder em cadeia nacional, só em 1982, portanto dez anos depois, foi que as emissoras públicas conseguiram fazer tal tipo de organização e, mesmo assim, sem tantas condições financeiras, até hoje passam por dificuldades para se manter.
Ainda em 1972 o Decreto n 70.568/72 substituiu o Conselho Nacional de Telecomunicações pelo Departamento Nacional de Telecomunicações (Dentel), foi criada a Telecomunicações Brasileiras S.A. (Telebrás). Foi desse ano também o início das transmissões de TV em cores, adotado o sistema PAL-M.
Em 1985 o Brasil passou a dominar a tecnologia da transmissão própria via satélite foi lançado, da Guiana Francesa, o primeiro satélite brasileiro, o Brasilsat1, e em 1986 foi lançado o Brasilsat 2. Em 1988 o Ministério das Comunicação regulamentou a TV por assinatura (TVA) e o DisTV, sistemas de distribuição de sinais que foram enquadrados como serviços especiais de telecomunicações.
Com a Constituição Federal de Outubro de 1988 foi criado um capítulo próprio da comunicação. Capitulo este que teve muitos problemas para ser construído. A comissão criada para elaborar uma proposta foi a única de todas as demais comissões da Constituição que não concluiu o relatório dos seus trabalhos, resultado da falta de acordos entre os setores representados e dos diferentes interesses. A Constituição tirou do presidente da República a decisão final pelas concessões, que passaram a ter que ser aprovadas pelo Congresso Nacional. Também foi reduzida para dez anos a concessão de Rádio e permaneceu em quinze anos a de TV. Foi também resgatada a função educativa como princípio primordial de qualquer emissora, sendo ela pública ou comercial. Alguns artigos da Constituição Federal:
Art. 220 - Fala sobre liberdade de expressão, proibição da censura, propaganda de alguns produtos, interdição de monopólio ou oligopólio e liberdade de imprensa escrita.
Art. 221 - Diz que a programação de rádio e de TV deve ser educativa e cultural, estimular a produção independente e a regionalização, e respeitar valores éticos e sociais.
Art. 222 - Interditava a participação de capital estrangeiro e limitava em 30% os investimentos de pessoas jurídicas nas empresas (modificado em 2002).
Art. 223 - Sobre o processo de concessão - dez anos para rádio e 15 para TV.
Art. 224 - Sobre a criação do Conselho de Comunicação Social como órgão auxiliar do Congresso Nacional.
A década de 1990 tem contribuições pontuais a dar à comunicação. Em 1990 o governo Collor de Mello extinguiu o Ministério das Comunicações, que foi incorporado pelo novo Ministério da Infra-Estrutura - que, em 1991, se tornaria Ministério de Transportes e Comunicações. Em 1991, o Decreto n 177/91 regulamentou o MMDS, sigla em inglês de Sistema Multicanal de Distribuição de Microondas, permitindo a transmissão de programas similares aos da TV a Cabo. Em 30 de Dezembro daquele ano também foi publicada a Lei n 8.389/91, que regulamentaria as atividades do Conselho de Comunicação Social.
No ano de 1995 foi criada a Lei do Cabo - Lei n 8.977, de 06/01/95 - que abriu 49% do mercado para empresas estrangeiras e classificou o serviço como de telecomunicações. Esta abertura gerou um importante debate na sociedade. Havia quem defendesse que este seria um instrumento par a democratização da comunicação. Porém, este modelo se mostrou ainda mais elitista do que a televisão generalista, e o máximo que se conseguiu foi a regulamentação de canais comunitário e universitários, até hoje pouco utilizados.
Em 1997, na gestão de Fernando Henrique Cardoso, foi publicada em 16 de Julho a Lei Geral das Telecomunicações - Lei n 9.472/97. Ela substituiu muitas atribuições do Código de 1962 e criou a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), que regulamenta e fiscaliza o setor das telecomunicações. A criação da Anatel teve como principal motivação a privatização do sistema Telebrás.
Em 1998 foi publicada a Lei das Rádios Comunitárias - Lei n 9.612, de 19/02/89, que limitou o uso das freqüências para entidades sem fins lucrativos. Esta lei, na prática, deixa o processo de concessão das rádios comunitárias ainda mais lento e burocratizado e tenta acabar com este tipo de comunicação.
Do final dos anos 1990 até os dias de hoje não existe concretamente muitas mudanças no que diz respeito à legislação de comunicação no Brasil. Continuam em vigor as leis e o jogo de interesses que historicamente fortaleceram o sistema comercial. Em 2002, com a chegada ao poder do atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva as expectativas de mudanças cresceram, mas nada foi, até então, de fato, concretizado. Neste mesmo ano foi aprovada uma emenda ao artigo 222 da Constituição, que permitiu a abertura de 30% do capital das empresas de comunicações para grupos estrangeiros e 100% para grupos nacionais. Foi também publicada a Lei n 10.610/02, de 20/12/02, que regulamenta a participação do capital estrangeiro nas empresas e criado, enfim, o Conselho de Comunicação Social.
Além destas medidas deu-se início a discussões que a princípio seriam importantes, mas que foram enterradas ainda no seu processo de gestação, como o caso da Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual (Ancinav), do Conselho Federal de Jornalismo e das discussões sobre a Lei Geral de Comunicação.
Em 30 de Junho de 2006, o Governo Federal publicou o Dec. n 5.820, conhecido como o Decreto da TV Digital. Esta regulamentação dispõe sobre a implementação do SBTVD-T (Sistema Brasileiro de TV Digital - Terrestre), a partir da adoção do padrão ISDB de modulação. Tal medida descumpre o Dec. n 4.901 de 26 de Novembro de 2003, que previa, dentre outras coisas, a expansão de tecnologias brasileiras e da indústria nacional relacionada às tecnologias de informação e comunicação, e disponibilizou recursos para tais desenvolvimentos. Esta mais recente regulamentação reabriu as discussões sobre a importância de uma Lei Geral de Comunicações que regulamente a atuação do setor, visto que a legislação vigente de base data de 1962 e não contempla os avanços pelos quais passaram os meios de comunicação, tampouco a convergência digital, prevista pelo novo decreto.

Para uma imponderável conclusão

A abertura do debate das bases legais e das políticas públicas que venham a quebrar com o oligopólio dos interesses comerciais em detrimento dos interesses públicos é fundamental para a construção de uma sociedade democrática. Só que esta abertura esbarra em uma questão quase estrutural. As relações entre parlamentares e grandes corporações de comunicação também são peculiarmente intensas, configurando uma grande força dos políticos-radiodifusores e dos radiodifusores-políticos. Evidentemente, essa realidade dificulta a aprovação de uma nova base legal que tenha como perspectiva a democratização dos meios de comunicação.
Mesmo com a Constituição de 1988, que timidamente tem alguns avanços no que diz respeito à função da comunicação, na garantia do direito à informação e da "livre expressão", na prática não há um marco regulatório claro para o setor. As concessões continuam sendo quase automáticas e praticamente inviáveis os mecanismos para sua cassação, a quebra dos oligopólios e a falta de compromisso com a proposta inicialmente educativa, regional e com produção independente de todas as emissoras passa longe de ser cumprida.
As leis base que tratam das comunicações ainda datam da Ditadura Militar ou são anteriores, como é o caso do Código Brasileiro de Telecomunicações de 1962. As leis elaboradas naquele período pouco ou nada têm a ver com a realidade colocada para as comunicações atualmente. Mesmo depois da Constituição Federal de 1988 rever alguns conceitos básicos da comunicação, as leis não foram atualizadas para permitir a garantia e regulação de alguns direitos previstos por ela, deixando um abismo entre o defendido na Constituição e a prática das políticas de comunicação no país.

Bibliografia

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Footnotes:

1Universidade Federal de Pernambuco. E-mail: edreboucas@uol.com.br
2Universidade Federal de Pernambuco. E-mail: marimartins.pe@uol.com.br